NOS BRAÇOS DE MORFEU

Não é de hoje que muitas pessoas enfrentam, em longas noites insones, a desgastante batalha do dormir. Não são suficientes nem que o rebanho inteiro de ovelhas brancas salte a cancela, nem que o riacho de águas claras e margens floridas flua pela imaginação ou ainda que todas as preces sejam rezadas, porque nada, absolutamente nada, parece sensibilizar o deus do sono. À falta de outros meios eficazes, recorre-se então à medicina e aos psicolépticos, que a princípio funcionam bem, mas logo exigem doses cada vez maiores que levam a indesejável dependência, sem falar em outros efeitos colaterais sobre o organismo. E como fazem falta noites bem dormidas, de sono profundo e sonhos agradáveis!

SURPRESAS

Acho que foi de professora do Grupo Escolar de minha cidade natal que ouvi, pela primeira vez, a conhecida história do ermitão que morava em caverna mal iluminada e que, de tão preguiçoso, nunca se animou a remover uma pedra encravada no canto em que dormia. Quando faleceu, moradores da cidade próxima resolveram fazer cuidadosa faxina no local, pois se tratava de ponto turístico de grande potencial. A surpresa veio quando a tal pedra foi deslocada, pois sob ela estava escondido fabuloso tesouro. Trata-se, bem reconheço, de narrativa simplória que, no entanto, pode ganhar significância se pensarmos nos tesouros espirituais de que poderíamos desfrutar, acaso nos dispuséssemos a remover entraves psicológicos que os escondem.

FUNCIONÁRIOS FANTASMAS

Era um radiante domingo de sol, com muitas nuvens brancas enfeitando o céu azul. A inauguração da nova praça, contígua ao cemitério municipal, contava com a presença de muitas autoridades e de contingente razoável da população. Eu inclusive, já que se tratava de minha comarca. Foi quando, minutos antes das solenidades, percebi o coveiro debruçado sobre o muro, somente a cabeça e os cotovelos aparecendo, uma figura sinistra, dessas dos filmes de terror. Então não resisti e disse ao Prefeito Municipal, bem ao meu lado, rindo disfarçadamente: “Está me parecendo um fantasma...”

PEQUENO ENSAIO NATALINO

Não foi somente o terrível mal que a princípio lhe roubara os cabelos, de lindos cachos louros, e depois a beleza do rosto jovem de olhos amendoados e delicado nariz, mas também a morte do cãozinho vira-lata, companheiro fiel de muitos anos, e pouco tempo depois o falecimento do avô, amigo incondicional das conversas de todas as tardes, que acabaram apagando o sorriso dos lábios da pequena Vitória.