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Aplicação dos Princípios do Direito do Trabalho - A Primazia da Realidade e a Reforma Trabalhista -

 Aplicação dos Princípios do Direito do Trabalho - A Primazia da Realidade e a Reforma Trabalhista -

Introdução

O arcabouço jurídico brasileiro que protege as relações de trabalho e emprego é imenso, porém não se deve olvidar que são os Princípios do Direito do Trabalho os mais importantes e aplicáveis a qualquer tempo, por provas, fiscalização, apurações de irregularidades e fraudes, mediante a Justiça do Trabalho, sempre com foco na proteção do trabalhador, sobretudo porque há visão de hipossuficiência do empregado nas relações provenientes de pactos trabalhistas.

Pela reunião e aplicação dos Princípios que informam o Direito do Trabalho é que se obterá a efetiva garantia contra as fraudes, sejam elas perpetradas por um lado ou outro durante o pacto laboral.

Enfim, mesmo diante da reforma trabalhista que foi recentemente implementada no Brasil, com novas legislação introduzida, com novas modalidades de contratação e flexibilização nas relações trabalhistas, não se deve deixar de aplicar as garantias em nível constitucional e os Princípios do Direito do Trabalho, vigentes, posto que nada foi revogado.

Dos Princípios do Direito do Trabalho

I. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO

Baseia-se em proteção preferencial a uma das partes: o trabalhador. Dele se extraem todas as regras, normas, doutrina e jurisprudências que tratem do direito do trabalho e que deve ser levado em conta na aplicação ao caso concreto. Não há permissão que se faça qualquer medida em favor da proteção ao trabalhador e também não será possível substituir-se ao legislador. Seu campo de aplicação é bem limitado e desde que se respeite esses parâmetros, não há ameaça contra a segurança jurídica.

Não há como utilizar tal princípio como regra de interpretação de prova, sem necessidade de consagração na legislação e seu valor não poderá ser tal que vá de encontro a uma norma de Direito Positivo. Sua recepção pode ocorrer de forma substantiva e também na forma instrumental.

O doutrinador uruguaio Américo Plá Rodriguez sustenta que o princípio de proteção reúne três formas distintas de expressão: “in dúbio pro operário”, norma mais favorável e condição mais benéfica.

REGRA “IN DUBIO, PRO OPERARIO”

Deve se levar em conta todas as vezes que uma norma possuir vários sentidos diferentes e uma escolha deverá ser feita: deverá prevalecer aquele sentido que for o mais favorável ao trabalhador. É a garantia de proteção maior à parte mais fraca na relação jurídica, ou seja, o trabalhador no contrato de trabalho. Será somente aplicada se houver dúvida sobre o alcance da norma legal e não deverá estar em desacordo com a vontade do legislador.

A sua possível aplicação em matéria de prova dos fatos deverá ser observada e quando a dúvida recair sobre a forma de se administrar ou dirigir uma empresa, a solução terá que se inclinar ao JUS VARIANDI, em favor do patrão.

REGRA DA NORMA MAIS FAVORÁVEL

No âmbito da hermenêutica jurídica não existe problema a respeito, pois entre normas de diferentes graus hierárquicos deve-se considerar aplicável a norma de grau superior e entre normas de mesmo grau hierárquico prevalece a que foi promulgada mais recentemente. No entanto o princípio da norma mais favorável torna o Direito do Trabalho peculiar. Não se considera uma ordem hierárquica predeterminada, contudo, no caso concreto, no contrato realidade, o juiz deverá interpretar e aplicar a norma mais favorável ao trabalhador.

A comparação entre normas deve ser feita, considerando o conteúdo de cada uma em separado e ao se comparar as normas considerar a situação de toda a coletividade trabalhadora interessada, e não apenas a situação do trabalhador considerada individualmente.

A questão deve ser resolvida objetivamente e não subjetivamente, e consoante os motivos que tenham inspirado as normas;

No confronto de duas normas, haverá sempre o exame do caso concreto, questionando se a regra inferior é, no caso, mais ou menos favorável aos trabalhadores e se não confronta objetivamente com cláusulas pétreas constitucionais de proteção ao trabalho, à saúde, à vida, etc.

A possibilidade de melhorar a condição dos trabalhadores constitui uma exceção ao princípio da intangibilidade da regra imperativa hierarquicamente superior. A eficácia de uma disposição inferior será nitidamente observada, embora se possa questionar que seja efetivamente favorável aos trabalhadores.

REGRA DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA

Esta pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deva ser respeitada, na medida em que for mais favorável ao trabalhador que a nova norma aplicável.

Embora pareça estar essa regra bastante relacionada com as anteriores, distingue-se de ambas: da primeira, por ser mais geral, aparecer na realidade como manifestação da mesma e ter formulação jurídico-positiva expressa; da segunda, por acarretar uma aplicação de norma em favor dos empregados, embora não referida à caracterização geral, mas a uma situação concreta e determinada.

II. PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS

A irrenunciabilidade é a impossibilidade do empregado abrir mão voluntariamente dos direitos concedidos pela legislação trabalhista que seriam inequivocamente para o benefício próprio.

A renúncia, por sua vez, equivale a um ato voluntário pelo qual o agente se desliga de um direito reconhecido a seu favor e o larga.

A proibição de renunciar importa em excluir a possibilidade de poder realizar-se, de maneira válida e eficaz, o desligamento voluntário dos direitos.

Com efeito, ao contrário do que no direito comum, onde rege o princípio da renunciabilidade, no direito do trabalho vige o princípio oposto, que é o da irrenunciabilidade. Ou seja, nos restantes ramos do direito alguém pode privar-se voluntariamente de uma faculdade, ou de uma possibilidade, ou de um benefício que possui, enquanto que neste setor do direito isso não é possível: ninguém pode privar-se das possibilidades ou vantagens estabelecidas em seu proveito próprio. (RODRIGUES, 2000, p.65)

Plá Rodriguez informa que somente De La Cueva e, de forma menos enfática, De Ferrari, sustentam que a totalidade das normas trabalhistas são irrenunciáveis. Os demais autores costumam utilizar expressões mais imprecisas, como “a maioria das normas”, “a generalidade das normas”, etc. A questão se torna mais interessante no Brasil, porque o Direito Pátrio considera os direitos trabalhistas como sendo de natureza alimentar, sendo mais um ponto favorável às teses que sustentam a irrenunciabilidade de tais direitos.

Este é um problema derivado do caráter não absoluto da irrenunciabilidade. Algumas vezes a irrenunciabilidade decorre do próprio conteúdo da norma, seja de forma explícita (que é a mais simples: ocorre quando se estipula expressamente o caráter de ordem pública da norma). Algumas vezes a irrenunciabilidade decorre da “ratio legis”, ou seja, da finalidade objetivada pela norma.

Não se requer um reconhecimento expresso no ordenamento para que a norma possa ser dita irrenunciável.

De toda forma, o juiz estará livre para decidir, no caso concreto, se foi prejudicial ou não a renuncia expressa ou tácita daquele direito, consoante os demais princípios que informam o Direito do Trabalho.

Destarte, as renúncias que ocorrerem contra as normas de ordem pública ou que tenham caráter de proteção, carecem de qualquer efeito: são absolutamente ineficazes, ou seja, insanavelmente nulas. O que se considerará nulo será a cláusula e não o contrato, que permanece vigente.

Como resultado disso tudo, a cláusula anulada será automaticamente substituída pela norma renunciada ilicitamente.

Importante ressaltar que os serviços prestados, mas em decorrência de um contrato nulo, não perdem seu valor. Devem ser, portanto, retribuídos. A nulidade do contrato tem efeito “ex nunc”, e não “ex tunc” e, portanto, o contrato valerá nos termos da norma ou cláusula renunciada, caso seja mais benéfica e consoante todos os demais princípios que informam o Direito do Trabalho.

III. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO

A relação jurídica de trabalho é regida por um contrato de trato sucessivo, ou seja, a relação instantânea de certo ato, mas que perdura no tempo. A relação empregatícia não é efêmera, mas pressupões uma vinculação que se prolonga formalmente e na realidade, ainda que seja por um contrato tácito ou verbal e se consagrará pela primazia da realidade.

A continuidade da relação de emprego é tudo aquilo que vise a conservação da fonte de trabalho e a dar segurança ao trabalhador, gerando benefícios não só a ele, mas também para a empresa, ao empregador e para a sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e a manter a paz social nas relações entre as partes.

Tal expressa a tendência do Direito do Trabalho, ao atribuir à relação de emprego a mais ampla duração, sob todos os aspectos. Não há dúvida que este princípio é estabelecido em benefício do trabalhador.

Plá Rodriguez expõe as seguintes projeções para mostrar qual é o verdadeiro alcance desse princípio:

a. preferência pelos contratos por prazo indeterminado;

b. amplitude para a admissão das transformações do contrato;

c. facilidade para manter o contrato, apesar dos descumprimentos ou nulidades em que se haja incorrido;

d. resistência em admitir a rescisão unilateral do contrato, por vontade do empregador;

e. interpretação das interrupções dos contratos como simples suspensões; e

f. manutenção do contrato nos casos de substituição do empregador.

O autor adverte, porém, que todas essas projeções denotam tendências, orientações, inclinações, não se tratando de regras absolutas, precisas e rígidas. Admitem exceções, limitações e restrições. Mas o importante é sempre lembrar que marcam uma orientação predominante.

Há de se observar também se o clima entre patrão, colaboradores e empregado ficaram tão tensas e insustentáveis que o ideal seria a opção da não continuidade, porquanto flagrante estaria a inviabilidade da relação de emprego em ambiente de paz.

IV. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE

Em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência aos fatos (contrato-realidade). O significado que deve-se atribuir a este princípio é o da prevalência dos fatos sobre as formas, formalidades ou as aparências.

Pelo Princípio da Primazia da Realidade o que vai importar é o que ocorre na prática, muito mais do que aquilo que conste em documentos, formulários e instrumentos de controle, o que só poderá ser aferido por perícia ou por depoimentos e por outros instrumentos informais de provas.

A existência da relação de trabalho (trabalho de fato) não exclui o surgimento do contrato. As estipulações contidas no contrato de trabalho não são inúteis, já que contam com a presunção, a seu favor, de refletir a vontade comum das partes. Enquanto não se demonstre que a conduta das partes foi diferente, prevalece a presunção emanada do texto do contrato.

Segundo Plá Rodrigues (1978, P.232) "na oposição entre o mundo real dos fatos efetivos e o mundo formal dos documentos, não resta dúvida de que se deve preferir o mundo da realidade.”

E ainda assevera o supracitado ilustre doutrinador:

V. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE

Deve-se proceder conforme a razão.

Todo o ordenamento jurídico se estrutura em torno de critérios de razão e de justiça, que partem da natureza da pessoa humana e buscam concretizar um ideal de justiça.

Evidente que a pertinência de um princípio desta natureza é mais necessária naquelas relações onde a índole de praxes normativas deixa amplo campo para a decisão individual. É um limite, pelo qual se freia e se aplica fundamentos e medidas, exatamente nas áreas do comportamento onde a norma não pode prescrever regras muito rígidas e onde a norma não pode prever uma infinidade de conflitos e circunstâncias possíveis.

Serve para graduar a verossimilhança de determinada aplicação ou solução e em outros casos atua como óbice, como limite de certas faculdades cuja amplitude pode gerar arbitrariedade.

VI. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ.

Ambos, na relação empregatícia, devem cumprir lealmente suas obrigações.

Um princípio geral que informa a totalidade de regulamentação, com características de postulados éticos, morais e jurídicos.

Refere-se à conduta da pessoa que considera cumprir realmente com seu dever, pressupondo uma posição de honestidade, honradez, dignidade, lealdade no comércio jurídico, porque detém a consciência de não enganar, não prejudicar nem causar danos.

Um problema que Plá Rodriguez coloca é o saber se este princípio inclui diversas formas atípicas de greve (ex. trabalho mais lento, trabalho com desleixo, etc).

O problema da licitude ou não dessas formas de luta não deve ser analisado em relação ao cumprimento ou violação do princípio da boa-fé. Deve-se partir da ideia de que todo meio de luta, por sua própria natureza, tende a prejudicar a outra parte. Caso contrário, não serve como meio de luta. Por outro lado, não se deve duvidar que a greve é um direito, como também uma ação, que se opõe a uma situação que foi provocada e que está gerando prejuízo, razão do movimento ocorrer em diversas situações.

Salvo a sabotagem e outras maneiras, que com elas se assemelhem, qualquer outra forma de luta pode ser considerada como greve. O princípio da boa-fé pressupõe o cumprimento normal do contrato.

DA PRIMAZIA DA REALIDADE E A REFORMA TRABALHISTA

Com a reforma trabalhista pela Lei 13.467 de 2017, vieram algumas alterações, possibilitando novas modalidades de contratação. A jornada de trabalho, o banco de horas, o intervalo para almoço, o plano de cargos e salários, a representação dos trabalhadores no local de trabalho, teletrabalho, o trabalho intermitente e o regime de sobreaviso, a remuneração por produtividade- gorjetas e prêmios inclusas- , a participação nos lucros e resultados, os trabalhos em ambientes insalubres passaram a ser temas de acordos coletivos, tais com alguma ou total prevalência sobre a legislação trabalhista, por modalidade contratual mais flexível. A Lei Nº 13.467, DE 13 DE JULHO DE 2017 não cortou ou eliminou direitos, porém foi uma forma de flexibilizar contratações, apenas isto.

A Justiça do Trabalho já vinha decidindo que se os acordos trouxessem cláusulas mais benéficas ao trabalhador do que a legislação tais teriam prevalência e assim deverá ser a visão doravante de todos os operadores do Direito. Havia o problema de não se ter a garantia de regulamentaçãoda possibilidade da criação de cláusulas contratuais que prevalecessem sobre a legislação vigente, em casos especiais, por meio de acordos coletivos, como agora após a entrada em vigor da Lei 13.467 de 2017. A impossibilidade também se dava porque algumas destas alterações, se introduzidas por acordos, simplesmente confrontariam a legislação e algumas interpretações poderiam ser danosas para os empregadores-contratantes, ainda que benéficas para os trabalhadores, em geral.

Há de se lembrar que o rol de Princípios do Direito do Trabalho supra elencado, referenciando o Mestre uruguaio Plá Rodrigues, presente em todas as obras científicas consultadas sobre o assunto, sempre será aplicado. Todos os Princípios estão em plena eficácia, seja pela forma jurisdicional ou doutrinariamente, evidentemente com variações conforme a Constituição Federal de cada nação, ao recebê-los no seu arcabouço jurídico trabalhista. No caso brasileiro, muitos deles aparecem em muitos pontos da CLT e em cláusulas pétreas da Carta Magna.

Nas hipóteses em que os juízes, da Especializada Jurisdição, verificarem que houve burla, simulação, fraude, conchavos entre grupos econômicos , com ou sem participação de sindicatos, mudança para regime de contratação menos benéfico, demissão individual ou em massa com posterior recontratação dos mesmos por uma nova modalidade contratual, redução de salários e vantagens, supressão de tempo de serviço ou outros direitos, evidentemente que decidirão pelo que for mais benéfico ao trabalhador, após tudo apurado pelo cômputo das provas obtidas pela realidade provinda dos fatos, do contrato realidade e não por meros documentos escritos com previsões aparentemente mais benéficas.

São inúmeras as hipóteses, somente examinando caso a caso para que se vislumbrem a nova jurisprudência que surgirá, caso novas burlas sejam constatadas. A cada emenda e a cada lei para se consertarem situações, novos abusos serão observados e novas sanções serão impostas pelos juízes e novamente pelos legisladores. Obviamente que o Poder Normativo do Direito do Trabalho estará sempre presente juntamente com os seus Princípios basilares.

Evidentemente, que o Direito é dinâmico e deve atender aos anseios da sociedade, primando por desenvolver mecanismos e legislações que possam ofertar mais colocações no mercado de trabalho, sem, contudo, prejudicar os hipossuficientes da relação contratual, que sempre poderão contar com os Princípios das normas mais favoráveis e benéficas, sobretudo com o da Primazia da Realidade, aplicados em conjunto.

Conclusão

Ainda que vozes contrárias a esta realidade transcrita se levantem, mesmo que mais politicamente ou ideologicamente do que doutrinariamente, somente o tempo dirá e confirmará que os Princípios do Direito do Trabalho, ainda que não escritos, continuarão a nortear as decisões judiciais, mesmo sobre as novas modalidades contratuais e confrontando-as com a CLT ou se impropriamente aplicadas, porque não se pode perder de vista que o contrato de trabalho é aquele que acontece cotidianamente, pelo modo e conveniência do momento, por JUS VARIANDI e por vários elementos que demonstrem como é realizado na prática, extraindo disto tudo se estão no mesmo diapasão da vontade do legislador na proteção aos contratados nos casos concretos diversificados.

 

Por

Daniela Fernandes Barros, acadêmica de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC/JF

e Dr. João Carlos de Souza Lima Figueiredo, advogado, OABMG 45.687 e ex-professor da ESA OABSP NÚCLEO DA 136ª SUBSECIONAL DE SÃO SEBASTIÃO em UBATUBA, pós-graduado em Direito Empresarial pelo IMBRAPE – OABSP e pela UNITAU – Gestores Rotarianos.

 

 

BIBLIOGRAFIA

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Referências

LEI Nº 13.467, DE 13 DE JULHO DE 2017.

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