PEQUENO ENSAIO NATALINO
Não foi somente o terrível mal que a princípio lhe roubara os cabelos, de lindos cachos louros, e depois a beleza do rosto jovem de olhos amendoados e delicado nariz, mas também a morte do cãozinho vira-lata, companheiro fiel de muitos anos, e pouco tempo depois o falecimento do avô, amigo incondicional das conversas de todas as tardes, que acabaram apagando o sorriso dos lábios da pequena Vitória.
Não houve mais jeito de fazê-la sorrir. Nem os palhaços que, semanalmente, visitavam o ambulatório a fim de levar um pouco de alegria aos pacientes, nem os inconformados pais que insistiam em comprar-lhe presentes e guloseimas, conseguiram que ela ao menos esboçasse leve sorriso. Na televisão ainda assistia, mas sem grande interesse, às estripulias do Mickey, da Pantera Cor de Rosa e de outros personagens de desenhos animados, porém sempre com o rosto sério de alguém tocado por profunda tristeza.
A psicóloga contratada, tida como especialista de larga experiência, também tentou tudo, inclusive consultando recentes obras sobre o assunto e ouvindo a opinião de outros colegas, mas tudo em vão. Parecia, mesmo, que a pequenina Vitória abdicara de sorrir.
Da mesma forma os médicos, que se esmeravam nos cuidados quanto à saúde da menina, esforçaram-se a fim de deter a crescente deterioração de suas condições físicas, na frustrada esperança de que, logrando ao menos pequena melhora, conseguirem restituir-lhe a alegria de ainda viver um pouco mais. Tudo em vão.
Em seu derradeiro passeio pelo shopping, já em cadeira de rodas, Vitória ainda pôde ver os enfeites de Natal nas vitrines das lojas, em tudo transparecendo a alegria pela vinda do Salvador. Foi então que simpático Papai Noel de longas barbas brancas, percebendo a menina de rosto sério e triste que o fitava, veio até ela e, pondo-lhe delicadamente a mão na cabeça cuja peruca mal disfarçava a ausência de cabelos, disse com voz suave e bondosa: “Sabe, filha, se você pedir de coração, Papai Noel pode dar-lhe tudo...” Mais do que as palavras da psicóloga e os cuidados dos médicos, aquelas palavras resgataram sua esperança de novamente ser feliz, a ela cuja vida material se esvaia inexoravelmente.
Em casa, no leito de alvos lençóis, ainda teve forças para fazer dois únicos pedidos a Papai Noel, conforme o velhinho lhe ensinara. E quando despertou, surpresa, viu-se em florido jardim em que Duque, abanando o rabo, veio lamber-lhe as mãos e, mais adiante, sentado em um banco de madeira, o avô acenava-lhe sorrindo. Pensou que estivesse sonhando, mas não, era real, muito real. Percebeu, então, que seus lindos cachos louros haviam voltado, e os olhos amendoados e o narizinho perfeito de novo lhe enfeitavam o rosto cheio de vida. Nesse momento voltou a sorrir...
Darly Viganó
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