JACARÉ DOS HOMENS por Darly Viganó
- por CorujaJF
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JACARÉ DOS HOMENS
Costumo brincar com amigos pedindo-lhes que repitam, tão depressa quanto puderem: “Quem nasce em Itaquaquecetuba é itaquaquecetubense ou itaquaquecetu-bano?” Trata-se de trava-língua com o nome indígena desse progressista município paulista, onde provavelmente não exista mais daquele tipo de bambu chamado “taquara”, que, rachado, corta como faca. Com efeito, em tupi-guarani “taqua” é a tal taquara, “quicé” é faca e “tuba” designação do coletivo. O “i” do começo do vocábulo teria sido um acréscimo fonético.
São muitas as cidades, distritos e povoados brasileiros com nomes exóticos, porém não somente de origem indígena como o citado acima. Alguns muito curiosos, fixados pelo passar do tempo, que tudo cristaliza. É o caso, por exemplo, de Passa Quatro, que muitos pensam tratar-se de crasso erro gramatical. Mas não é nada disso. Na antiga descrição atribuída ao bandeirante Fernão Dias Paes Leme, para se chegar ao local onde se encontra aquela aprazível estância mineira, após transpor a serra o viajante deveria passar por quatro riachos. Estaria aí a origem desse original nome de cidade.
Outros, porém, pela imensidão desse Brasil afora, além de curiosos são igualmente engraçados. Recordo-me de Passa e Fica, no Rio Grande do Norte, originário de hospedaria no caminho entre Nova Cruz e a Serra de São Bento, local por onde boiadeiros passavam e ficavam por algum tempo a fim de levar seus rebanhos às feiras de gado tanto do estado potiguar, quanto de Pernambuco.
No Rio Grande do Sul, a próspera cidade de Dois Vizinhos fica localizada próxima a curso d’água que leva esse nome em razão de desbravadores gaúchos e catarinenses que, na década de 1940, colonizaram o local, então inóspito e tido como de “terras fracas”. O que não sei é se ainda há pescadores profissionais no tal rio. Outra progressista cidade gaúcha, com forte presença de imigrantes alemães e italianos, é Não-me-Toque, cujo nome deriva, segundo alguns, de certa árvore de tronco curto e espinhoso chamada “não me toques” ou, de acordo com outros estudiosos, dos protestos de antigo fazendeiro, instalado no local, que sempre clamava “não me toque nestas terras” ou “não me toque daqui”. Em 1976, um plebiscito manteve o nome original da cidade, que muitos pretendiam mudar.
A pequenina Paraíba também é pródiga em nomes exóticos. Fico pensando como poderiam ser chamados os que nascem em Beijo das Freiras, denominação que imagino tenha surgido do respeitoso costume das religiosas de beijar a mão de prelados. Mas dos que vieram à luz em Carrapateira, nome que lá se dá ao prosaico mamoeiro, não é difícil saber qual é o toponímico.
Existe até mesmo, pasmem os leitores, uma tal constrangedora Pintópolis em Minas Gerais, derivada do nome de família de seu fundador, Germano Pinto. E no Estado do Rio de Janeiro encontra-se a pitoresca Varre-Sai, que nasceu, em meados do século XIX, do costume de respeitada senhora chamada Inácia, dona de uma pousada, de exigir, dos tropeiros que lá pernoitassem, cuidadosa varrição do estábulo antes de saírem.
Conversando com a benzedeira Severina, vim a saber que é natural de Jacaré dos Homens, nas Alagoas, cidade em que sua avó está sepultada. “Jacaré” porque, explicou-me ela, há muito tempo, quando era apenas uma vila, foi encontrado um desses perigosos bichos naquelas bandas, e “dos Homens” porque nela só moravam cidadãos muito sérios. “Mas lá não existe mais nem sinal de jacaré e desconfio que também são cada vez mais raros os homens sérios da cidade. Nem com reza brava tem cura, seu doutor...”.
Darly Viganó
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