CARTA : Obediência aos Mestres
- por CorujaJF
-
em Artigos
-
Acessos: 704
CARTA :
OBEDIÊNCIA AOS MESTRES !
Quando eu era criança, não perguntava para o meu avô as razões que ele tinha para me mandar desentortar pregos na bigorna, nem sobre a necessidade de colocar lata d’água cortadas como canaletas ao redor dos canteiros de rosas e de algumas outras plantas, nem tampouco porque eu tinha que parar a cada 50 minutos de trabalhar e tomar café e descansar por dez minutos e fazer outro tipo de serviço, um outro diverso. Não perguntava nada, só seguia o exemplo, quando ficava na casa dele naquelas tardes. Belas tardes. Obedecia ao Mestre que tinha estudado tudo que há no mundo, estudo para ser padre. Obedecia, pois eu sentia segurança e conforto. Não perguntei jamais porque tinha que datilografar os artigos que ele escrevia para o jornal ; logo eu , um garoto recém formado pela Remington, com apenas 14 anos de idade, já acostumado desde aos oito anos a plantar, colher, desentortar pregos, arrumar gavetas, ler, aprender a matar frango, como limpá-lo, com álcool na pia , sob fogo na retirada dos restos de penas, assistindo à minha avó, ela fazendo tudo e tirando o sangue pelo pescoço a escorrê-lo no prato branquinho Obedecia à Mestre.
Não perguntava ao meu pai porque sempre tinha que datilografar tudo em três vias, com carbono, sem poder errar, para não ter que repetir do zero, com paciência e esmero, desde os meus 15 anos. Simplesmente, obedecia ao Mestre que transmitia mais e mais conhecimentos, conforto e segurança. Não perguntava porque tinha que fazer a feira daquele jeito e qual seria a razão da casca da mandioca ter que soltar fácil ou qual seria motivo de apertar as extremidades da cebola, por que quebrar o talo da ponta do quiabo? Por que a carne do açougue seria aquela apontada ?... Seguia o Mestre, com segurança e conforto.
Não perguntava muito ( muito não, rs rs rs ) ,para a minha mãe, a importância de eu estudar idiomas (até então eram 2 ou 3 de uma só vez ), datilografia, judô, karatê, teoria musical, praticar inúmeros ou todos os esportes, já que eu ainda tive que assistir às aulas que ela ministrava de manhã, para que eu pudesse dar paz aos meus irmãos à tarde, quando, então, eu ia para a minha escola. Fiz o primário dobrado, oito anos em quatro. Simplesmente, obedecia à Mestre. As empregadas e a casa agradeceram e agradecem para sempre, pois ficaram livres das minha traquinagens e das artes perigosas.
Aprendi!
Sabia apenas que deveria fazer tudo com amor, começar do zero quando errasse, levantando do chão quando caísse, recomeçando a andar, mas que não entrasse jamais em quizumba. Uma tríade famosa, absorvida desde a minha infância.
Minha grande Mestra, mãe, professora, médica, pintora, poetisa, violinista, pianista, costureira, tricoteira, crocheteira, escritora, sábia leitora, palestrante, trovadora, artista em tudo que se metia, arquiteta de quatro casas etc, etc, etc..
Não perguntava nada para meu avô, para minha avó, para meu pai e minha mãe, apenas obedecia porque eles me educavam em casa fazendo e, assim, eu já estaria prontinho para ir a Escola estudar e ter o ensino necessário, podendo, assim, fazer um décimo do que eles faziam em casa, seja nas artes (piano, violino, pintura, poesia , desenho, marcenaria, tricô, crochê , escrita etc) agronomia, leitura, escrever artigos, falar e traduzir idiomas, ler nos originais, consertar tudo ... etc ...
Só me sobraria a inteligência agora para o bem. Nenhuma responsabilidade aos que me educaram em casa, que me ensinaram tudo. Agora, doravante, tudo seria por minha conta. Só me restaria a mentoria que doaria aos meus amigos, colegas, alunos de Alemão, Inglês, Química, Física e Direito, para todos os meus clientes na advocacia, para os meus amigos na discotecagem e produções musicais. Só me restaria, agora, conviver bem com todos e entender como não compreendiam e integrá-los, pela mentoria. Agregar. Escrever tudo, meus poemas, artigos e trovas, distribuindo a todos. Ajudar os meus sócios nas empresas, as conversas paralelas que resolveriam tudo. Só me sobrara, na verdade, a mentoria que foi cultivada durante os meus primeiros 15 anos, a educação do lar, dos meus ancestrais, para poder ler tudo que li, vivi, trabalhei e convivi, tudo que ensinei e escrevi. Não tão difícil como educar a minha única filha, filha única, pois muito difícil ter filha única. Virei criança para rolar com ela no tapete para que ela tivesse um irmão, ainda bem que sabia brincar e lembrava bem da minha época de céu no chão e nas árvores. Tive que ficar corcunda muitas vezes, porque cresci demais ...
Ainda bem que sou da época do Colégio de Aplicação João XXIII, da UFJF, turma de 1976, lá do ginásio, onde ensinavam a ensinar; ainda faziam isto. Ainda bem que incentivavam a leitura e a gostar do que mais gosto que é ler e escrever, principalmente sobre Filosofia e História. Lazer para sempre. Ainda bem que sou cinéfilo e amante de todos os bons estilos de música de todos os tempos. Ainda bem que eu amo tudo que aprendo e faço, querendo aprender mais. Nunca tive nem tempo para tristeza, só para a alegria, por fazer tudo com muito sabor e felicidade.
Lembre-se que cada um tem um sistema e cada um acha que o seu funciona melhor do que o do outro. Sobretudo, jamais se esqueça: SE FUNCIONA É OBSOLETO ( Prof. Dr. Luiz Machado , Curso da Cidade do Cérebro ).
Esta carta é mais para lembrar sobre a mentoria que é uma espécie de especialização no ser humano. Seria decidir ser mestre e obediente ao outro mestre, uma forma de dar refresco à outra alma, quando se escuta e se consola, aconselha e soluciona. Toda doença da alma brota quando não se trabalha e não se pratica o servir, sobretudo quando se guardam todas as frustrações nos frascos do rancor e nas panelas das mágoas. A panela de pressão implodirá ou explodirá. Entender e ensinar para sempre é uma missão, a mentoria constante. Constatar que não produzir gera desconforto para todos. Só consumir gera lixo e sucata para o outro catar. Sobrar muito lixo para todos os outros é muito ruim. Aquele trabalho que não se esperava, ou seja, criando insegurança e desconforto.
Não ler, não escutar e não olhar dentro do olho gera a distância entre um ser e todo o mundo que já existiu, que existe e que existirá. Não fazer o necessário gera a distância entre os seres. A mentoria é uma benção quando bem aplicada, uma inteligência de alma, muito superior ao conhecimento, seja pelo “savoir faire” ou pelo “know how", não interessando de onde vier.
A mentoria bem sucedida é fruto de amor pela solução, uma bela intuição, com conhecimento, experiência, vivência, como um boa imaginação bem aplicada, sem tentar adivinhar. Seria realizar o compreender, entendendo que o outro não entende o mundo que foi vivido por um outro ser, simplesmente porque não se interessou pela vida de um outro sistema que fora aplicado por outros ancestrais. Interessar-se por tudo é um bom começo, apaixonar-se por isto com amor é uma missão para lidar até o fim do caminho, até o céu. Já, se aposentar de tudo seria o inferno vazio num grande deserto, sem ninguém feliz ao seu redor, sem poder assistir ao seu sorriso.
Trabalhar no que ama é uma das melhores soluções para se atingir o objetivo maior : a felicidade!
Quando encontrar o Mestre, obedeça: esta é a primeira e também a última lição.
Sem prestar atenção na simplicidade jamais encontrará o mestre e, então, não obedecerá a ninguém.
Abraços do CORUJAJF
São Paulo, 17 de julho de 2018.
JOÃO CARLOS DE SOUZA LIMA FIGUEIREDO